ARTIGO: Abolição da escravidão e o ativismo negro

Foto: Agência Brasil

A Abolição no Brasil e em outros países da América Latina foi um processo inacabado. Não provocou mudanças na estrutura fundiária, não garantiu escolarização nem inserção no mercado de trabalho para os ex-escravizados. Ao contrário, impediu avanços institucionais que deixaram lacunas até hoje na vida econômica, social, política e cultural do país, naturalizando as hierarquias raciais e as persistentes desigualdades engendradas pelo racismo estrutural e institucional que impedem a ascensão e mobilidade dos grupos étnicos minorizados.

É equivocado atribuir passividade aos negros/as no processo de Abolição da escravidão. Desde a estruturação do projeto de colonialidade, com a vinda forçada dos africanos/os, iniciou-se a produção de estratégias e táticas de contestações e luta por emancipação e liberdade, sendo a mais radical o Quilombo de Palmares.

Tais agenciamentos ajudam a nos distanciar da visão romantizada da escravidão suave. Porém, na fase conclusiva da Abolição a rebeldia negra ficou subordinada àquelas forças abolicionista moderadas e tímidas, ofuscando as diversas formas de resistência negra e exaltando a memória dos abolicionistas de outro grupo étnico.

Após a Abolição, sobressaiu a ideia abstrata de liberdade. Negros/as foram vistos como classe perigosa que ameaçava a ordem vigente, cuja condutas foram criminalizadas: no passado, a capoeiragem, vadiagem e mendicância e, no presente, tem-se o rechaçamento dos seus modos de vida, representações vexatórias de suas imagens e características cotidianamente.

Esse tratamento desumano via coerção e violência deu margem para o espraiamento do que se convencionou chamar criminalidade mestiça, tecnologia sofisticada de controle social e político.

O tratamento conferido aos negros/as explica o padrão precário de vida que têm na estrutura social. Ou são tidos como coitados e pobres dignos de ações clientelistas e assistencialistas, ou como marginália alvo da polícia. Nenhuma dessas formas tem sido propulsora de justiça e cidadania.

Na busca por transformação de suas condições objetivas e subjetivas de existência, esse grupo étnico tem resistido de formas plurais, por meio do espírito de associativismo inscritos nas revoltas, insurreições, por meio da imprensa negra, da religiosidade, ao instituir centros de cultura, clubes negros, movimentos negros, coletivos juvenis, organização das mulheres negras e tantas outras ações coletivas.

O povo negro de diversas formas visa o reencontro com sua humanidade e manter-se vivos. Nessa direção, por todo o mês de maio, com seu ativismo, ressignifica a data do 13 de maio como dia nacional de luta contra o racismo, de denúncia das desigualdades raciais e reafirmação de sua negritude.

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Escrito por Zelma Madeira, veiculado em 28/5/2021 no Diário do Nordeste. Zelma é doutora em Sociologia, estudiosa de questões como gênero, religião de matriz africana e relações étnico-raciais.